segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Mudança

Hoje, um sábado, foi assim: dia de mudança.

Há tanto tempo tento mudar, que acordei bem disposto. Bem disposto uma vírgula, pois cheguei a casa bem de madrugadinha, quase amanhecendo, vindo da “Festa dos Imprensados”, na acolhedora vivenda de Alcélio e Regina Monteiro.

Às sete, a contra-gosto, já estava de pé. Foi deitar e levantar! Não tomei café e não há muito que contar. Até às três da tarde, foi um sobe e desce infindo. Como se acumulam coisas inúteis dentro de uma casa! Como se acumula fome quando o trabalho é braçal! Como se desperdiça loucura quando o trabalho é escrever!

E como se acumulam fantasmas durante uma vida! Em cada armário a limpar, em cada foto esquecida, em tudo há um pedaço de vida a nos lembrar que o tempo é implacável.

E como sói acontece, os amigos que diziam “quando chegar a hora me avisa, que te darei a maior força” não apareceram. Gastei a força de um mês em apenas meio dia. Cuidamos da mudança, eu, minha filha, minha irmã e uma prima, esta com problemas nas articulações.

Mas, apesar das dores por todo o corpo, mudança nunca é sinônimo de tristeza ― afinal, “casa nova, vida nova”. Acabado o transporte, deixado o resto para o dia seguinte, deitei-me no sofá e dormi até às sete da noite. Acordei com vontade de vinho.

Minha adega é pouca, não sei pela falta de ir ao supermercado, não sei se pela sede que impede uma reposição a contento. Peguei o Astica (um Merlot/Malbec encorpado, seco como meu coração e nossas pastagens no final de inverno/início de primavera ― e não vou citar o bouquet, os taninos suaves, o amadeiramento nobre, o frutado das flores silvestres). Bebi o vinho de terceira como se aguardente fosse, e de quinta. Importava beber.

No meio da bagunça, minha filha descobriu salaminho, queijo e pistache.

Restávamos, ao final, eu, minha filhota e minha irmã. Vinho, pistache, vinho, queijo, vinho, salame, vinho... e a danadinha começou a filosofar. Meus cinqüenta e um outonos suportaram bem os vinte e três verões de falação filosófica de minha herdeira (era argentino, o Astica).
Minha irmã só escutava. Estávamos sóbrios, eu e minha filha, mesmo depois de dois asticas.

Deixo de atender, ao telefone, uns quantos convites para sair.

Acesso meu blog e fico feliz com os comentários de Fernanda, Nayara, Renata e Milena. São minhas leitoras preferidas. Não me sinto digno delas. Elas me obrigam a escrever sempre mais e melhor. Mas hoje não, queridas. Estou cansado e sem inspiração.

É tarde da noite, mas meu espírito indômito me futuca para sair e só voltar de manhã. Sou salvo pelo telefonema de uma amiga. Meia hora de conversa me convence. Fico. Fico só.

Vou dormir decepcionado. Sou meio nômade, cigano. Já morei em tantas casas diferentes, em tantos corações indiferentes... Hoje, mudei mais uma vez. Enfim, estou mudado. Estou? E por que então não deixo de amar aquela uma? Ou por que estou começando a amar aquela outra, que é a mesma que aquela uma?

Ah, porra, por que um homem que muda tanto de casa não consegue mudar de coração, de pensares...?

Pobres de nós, escritores, que damos vida a personagens tão distintos, que lhes fazemos felizes ou tristes, que lhes controlamos cada passo, mas não sabemos conduzir nosso próprio destino. Por que não conseguimos nos dar meio e final felizes? Por que não conseguimos mudar o livro de nossas vidas?

3 comentários:

Paixão, M. disse...

xingandooo! coisa feia, rs...

agitados esses seus dias, hein?! pena que perdi a parte da festinha... choveu tanto que nem teve aniversário do Luiz :( Fiquei no seminário de história.

Que citação honrosa!! E somos exigentes mesmo! Por isso que a gente lê você e pede atualização diária, rsrs.

bjos e hoje vai o retrato =)

Anônimo disse...

Vinhozinho, salaminho, queijinho... Mas isso ta mais pra festança do que pra mudança, uai!

"Elas me obrigam a escrever sempre mais e melhor." - Mas bem que você gosta da bajulação, né?

E não xinga não, hein! Tsc tsc tsc! Coisa feia!

Renata Mofatti disse...

Háááá !!! Vinho de terceira, aguardente de quinta... Essas coisas muito me agradam... Quer trabalhar mais um pouquinho? Que tal limpar minha "Vida na estante"? rsrsrsrs