terça-feira, 19 de agosto de 2008

Faíscas de amor

Quando dois olhares se encontram, nunca se sabe o que pode acontecer. Não se preocupe se for um olhar de peixe-morto. Mas, se saírem faíscas...

Para espantar a tristeza, às vezes penso em você. E quando isso acontece, como agora, há um acúmulo muito grande de energia em meu corpo. Meus elétrons se agitam, colidem entre si e fogem de suas órbitas. O corpo todo parece explodir. Eles saem do meu corpo e então fico leve, pairando no ar, com uma sensação inebriante. Como os elétrons têm carga negativa, quando se afastam sobra apenas o núcleo, que possui carga positiva. Pronto!, fico carregado positivamente — um cátion. Fico alegre, cheio de disposição para tudo. Fico de bem com a vida, bendizendo o dia em que conheci você.

Hora qualquer, esses meus elétrons não voltarão, ficarão vagando pelo espaço, e aí acabou-se eu.
Por uma imposição física, meu núcleo não consegue ficar sem meus elétrons. De tão carregado positivamente, ele implode, se esfacela, vira uma massa informe de subpartículas, os quarks em suas inúmeras e diferentes variedades, pelo menos seis “sabores”: up, down, strange, charmed, bottom, top e tantas outras ainda a descobrir e nomear e tantas outras já descobertas e que não me lembro agora e não vou me lembrar nunca mais, se Deus me ajudar. Imagine que cada “sabor” se apresenta em três “cores”: vermelho, verde e azul. Forma-se então o antipróton, como o pósitron é o antielétron. Desculpe, minha cara, sei que isso não é aula de teoria atômica ou mecânica quântica, mas...

Mas você sabia que poderia existir realmente um antimundo e antipessoas, feitas de antipartículas? Nesse antimundo você seria meu antieu. Nele não poderíamos nos tocar, porque senão desapareceríamos ambos num foco de luz, num cogumelo atômico. Acho que nesse caso “acabou-se o mundo”, porque a energia positiva que tenho causaria uma explosão mil vezes superior à explosão de mil bombas de nêutrons.

Mas desse mal não morreremos: a luz do seu olhar, a antiluz, me neutraliza; reduz-me a antipartículas.

Aqui entra o princípio da exclusão de Pauli, que afirma que duas partículas não podem existir no mesmo estado, ou seja, não podem ter ambas a mesma posição e a mesma velocidade dentro dos limites estabelecidos pelo princípio da incerteza. O princípio da incerteza reza que... bem, ele me diz que vou viver assim, sempre na incerteza... bem-me-quer, mal-me-quer, bem-me-quer, mal-me-quer... Se o mundo tivesse sido criado sem obedecer ao princípio da exclusão, os quarks não formariam prótons e nêutrons diferentes e bem definidos. Nem haveria átomos também diferentes e bem-definidos. Nem haveria eu e você diferenciados. Seríamos todos uma massa uniforme e densa. Seríamos uma coisa só.

Não somos uma só coisa, eu e você?

Se você me olha viro antimatéria. O vazio. O Nada.

Mas desse mal não morreremos nós: a luz do seu olhar, a anti-luz, me neutraliza; me reduz a anti-partículas.

E se você me olhasse de novo veria que eu vou murchando, corpo e mente. Entro num estado vegetativo. Fico macambúzio. Tudo perde a graça, tudo perde o sentido, tudo é nada. Tudo fica em estado de suspensão, como se tivesse atingido o quinto estado da matéria. É um estado catatônico. Pode passar uma avalanche sobre mim e, quem sabe?, não me afetar em nada. Pode ser que uma mosca me pouse e eu desabe. Pode ser que eu fique vivo... Pode ser. Fico como um adolescente à beira de um jardim a retirar pétalas da rosa e a recitar: mal-me-quer... bem-me-quer...

Pois é assim que me sinto, às vezes. Tudo pára; tudo fica suspenso no ar — só há a surpresa, o encanto e o medo.

Há o medo do seu sorriso, de um gesto, do seu olhar. Outro pedaço dele é saber que há coisas inatingíveis nesse mundo, coisas que desejamos ardentemente, mas que estão muito além das estrelas, na vaguidão do espaço. Esse é um pedaço do medo. Mas ele é tão grande... Parece um buraco negro que vai me sugando, me sugando, me sugando...

Mas que medo é esse, que guarda tantos segredos? Talvez o medo de que os elétrons voltem em dobro e eu fique super carregado negativamente, um ânion violento, de milhares de volts, dando choques e transformando em cinzas quem me tocar; talvez o medo de que os meus elétrons retornem trazendo junto deles os elétrons da verdade. E dela eu não posso fugir dela, apesar de querer. É tão bom sonhar, faz parte da vida. Mas a verdade é que nossos elétrons nunca orbitarão o mesmo átomo, nunca girarão em torno do mesmo núcleo, nunca ocuparão o mesmo espaço. Eu nunca trocarei elétrons com você. Você é feita de matéria especial, vinda do espaço sideral. Você é de outra dimensão, talvez a sexta. Eu, malemal existo na terceira.

Vivendo assim, em diferentes dimensões, no máximo podemos trocar alguns fótons virtuais — já que os reais nunca poderiam ser diretamente detectados —, como se fôramos elétrons passando um pelo outro. Em linguagem leiga, essa emissão de fótons virtuais, que podem ser provocados e detectados como ondas de luz, é o popular “sair faísca”.

Imagine então a seguinte situação: você me toca e o mundo explode, em bilhões de faíscas. Isso também me dá medo, essa sabedoria popular. Pois quando lhe vejo o mundo não fica mais radiante?

São os seus fótons, minha cara, são os seus fótons.

3 comentários:

Anônimo disse...

*apavorada por se lembrar das aulas de química* Eu ACHO que entendi o que você quis dizer.

Unknown disse...

adorei suas obras,achei fascinate viaja no mundo da poesia.
que você continui.......
trabalhando para isso
bjs

Renata Mofatti disse...

Eh !!!Sai correndo pessoal, que lá vem faísca!!!!